Eu me lembro de muitas coisas da minha infância e adolescência, mas nada me marcou tanto quanto as conversas que tínhamos em família ao redor da mesa. Foi desta forma que aprendi as coisas mais valiosas, tive os papos mais construtivos e os maiores puxões de orelha também, rss.
Na minha adolescência, meu pai trabalhava por conta própria e fazia os próprios horários. Minha mãe trabalhava na parte da tarde e da noite como professora. Eu estudava a noite e minha irmã, à tarde. Logo, todas as nossas manhãs eram muito tranquilas e nossos cafés, longos e muito gostosos de se curtir. A gente levantava para tomar café e já emendava longas conversas sobre tudo o que vocês podem imaginar. Por isso, digo que minhas melhores e maiores recordações de momentos especiais, são ao redor da mesa. E isso dura até hoje, porque sempre que vou à casa dos meus pais aos fins de semana, em meio a uma pizza ou um jogo de baralho, os papos mais gostosos acontecem. Os bons hábitos tendem a permanecer por toda a vida (e os maus também se não aprendermos a mudá-los).
Estou falando sobre isso, porque quero abordar sobre a importância das refeições em família. Em tempos onde os pais passam a maior parte do tempo fora e os filhos estão envolvidos em cada vez mais atividades extracurriculares, é preciso resgatar ou – pelo menos – programar as agendas para que este momento ocorra sempre que possível.
Como é o café da manhã na sua casa? Às vezes é tanta correria que seu filho, ou mesmo você, só consegue terminar o sanduíche no carro indo para a escola (ou trabalho), não é mesmo? E na hora do jantar, geralmente está todo mundo tão cansado, que cada um faz seu prato e come onde bem entende (em frente ao computador enquanto olha as novidades da rede, em frente à TV curtindo seu programa preferido…). Eu sei que é assim, porque caio nesta armadilha da convivência familiar muito frequentemente. Eu sei que a rotina é alucinante para todo mundo e – às vezes – a gente mal consegue ir ao banheiro (risos), mas talvez seja hora de repensar alguns hábitos.
O site Vida de Mulher publicou uma pesquisa que revela que conversar durante as refeições ajuda a criar filhos mais confiantes e seguros na vida. Esta pesquisa foi realizada com 34 mil crianças e adolescentes pelo Literacy Trust, uma instituição inglesa dedicada à alfabetização e incentivo à leitura. Para chegar a este resultado, as crianças responderam como era o momento das refeições em suas casas, e algumas perguntas que indiretamente avaliavam suas habilidades comunicativas e sociais.
O levantamento descobriu que 87% das crianças sentavam com as famílias durante as refeições, mas desse grupo, uma em cada quatro não dialogava com os pais ou irmãos. Entre aquelas que sempre comiam com os pais e conversavam durante as refeições observou-se o seguinte:
– 75% disseram se sentir à vontade para participar de um debate em sala de aula;
– 62% disseram se sentir bem ao falar na frente dos amigos na classe.
No grupo das crianças que não conversavam à mesa, os números são um pouco diferentes, veja:
– 57% disseram se sentir à vontade para participar de um debate em sala de aula;
– 47% disseram se sentir bem ao falar na frente dos amigos na classe.
Por meio desses parâmetros, os pesquisadores concluíram que conversar com a família à mesa é uma excelente ferramenta de estímulo e desenvolvimento social para a criança, além de colaborar na construção de sua autoconfiança.
Eu sei que é difícil conseguir fazer todas as refeições juntos. Eu diria que é praticamente impossível frente à realidade de vida dos grandes centros urbanos, mas minha dica aqui é para que vocês separem pelo menos um dia especial da família, onde sentam calmamente à mesa, comem juntos e – acima de tudo – conversam. Busquem saber o que pensam, como pensam ou por que pensam de certos assuntos. Aproveite para instruir e ensinar o que tiver a oportunidade, pois o ambiente da mesa de refeições geralmente é leve e descontraído. DESLIGUE A TV E OS CELULARES/TABLETS, e mantenha o foco no relacionamento, pois grande parte dos problemas familiares hoje em dia acontece pela falta dele. Falta intimidade, falta conhecimento sobre o outro, falta diálogo e falta convivência de qualidade. Não se trata de quantas refeições vocês conseguem fazer juntos, mas da qualidade delas quando acontece, guarde bem isso. Aquela realidade que a gente vê em comerciais de TV – onde a família come toda feliz à mesa – é possível dentro da sua casa também, pode acreditar.
Ouso dizer que se você se preocupar com esta parte da vida em família, deixará de ter muitas outras preocupações quanto ao comportamento e educação dos seus filhos, pra dizer o mínimo. Na medida em que forem praticando o diálogo aberto e leve à mesa, os filhos tendem a começar a se abrir e permitir que você tenha acesso ao seu mundo. Dúvidas surgem quanto à vida e está aí a sua oportunidade de ouro de trabalhar até mesmo assuntos tabu na vida deles, como drogas e sexo, por exemplo. Muitas conversas como esta eu tive com meus pais sentada à mesa e posso dizer: nem a escola conseguiu bater o conhecimento e a sabedoria que adquiri nessas áreas ao conversar abertamente com meus pais no ambiente do lar e da forma tão espontânea e gostosa como ocorreu. Falo isso porque alguns pais acham que conversa séria tem que ser sentado no sofá, com hora marcada e dizendo a famosa frase: “Filho, precisamos ter uma conversa”. Meu… se você quer afastar uma criança/adolescente ou fazê-la se proteger emocionalmente de todas as maneiras possíveis, faça exatamente isso! Nem os adultos reagem tão bem quando queremos colocar um peso (desnecessário) em certas conversas – as famosas DRs, rss.
Tudo o que acontece no âmbito informal e leve do lar, marca e ensina muito mais os filhos. Eles aprendem brincando, rindo, trocando ideias, e não com hora marcada, levando sermão ou ouvindo uma palestra informativa (risos). É claro que vez ou outra esse momento sério e marcante precisa acontecer, mas a maioria do que pode ser ensinado e aprendido à mesa, pode até evitar esse embate mais formal.
As conversas em família à mesa moldaram minha forma de enxergar o mundo. Tenho certeza que muito da confiança e dos conhecimentos da vida que obtive, foram por causa de experiências ricas obtidas dessa forma. Venho colocando isso em prática aqui dentro da minha casa, e até minha bebê de 1 ano e 8 meses me cobra quando não sentamos todos à mesa. Quando estou com preguiça de fazer tudo como deveria e tento dar comida para ela na sala, por exemplo, ela me diz: “Não. Na mesa!” Como vou questionar ou dizer que não? Ela está certa, porque ela sabe que lá tem sido divertido, que todo mundo conversa e ela adora essa parte. Quem não gosta, não é mesmo?
Refeições em família onde há diálogo aberto e sem reservas, moldam a confiança dos filhos e são uma ótima oportunidade de ensinar. Eles serão pessoas muito mais comunicativas, conhecedoras da vida e abertas à diálogos com vocês pais, se vocês se permitirem abrir esta porta na vida familiar de vocês. Esqueçam o conceito antigo de que na hora da refeição não se fala! É justamente o contrário se o que você quer é construir um relacionamento saudável e relevante dentro da sua casa. Não tenha medo de ser feliz nessa parte! Brasileiro que é brasileiro só faz festa quando tem comida no meio. Aproveite a comida para fazer festa na sua família, celebrem a vida em comum, o amor e o desenvolvimento do lar no sentido de ser o local mais seguro e gostoso de se estar. São momentos como este que dão significa à vida e fazem valer a pena todos os sacrifícios e dificuldades por que passamos. Um dia nossos bebês olharão para trás e poderão dizer que os momentos mais felizes que tiveram foi ao redor da mesa com a família? Eu espero que sim! (risos)
Sendo assim, boa refeição/conversa para você!
*Este post eu dedico aos meus pais: Artur e Vanda. Amo vocês! Obrigada por tudo.