Em agosto de 2018 vivi um dos momentos mais tristes da minha vida, que foi ter uma gravidez ectópica .
Por conta de todos os problemas ginecológicos e hormonais que tenho, achei que nunca seria capaz de engravidar naturalmente, felizmente estava errada! No entanto, quando engravidei meu bebê estava fora do útero! Constatado isso no início da gravidez, minha médica me encaminhou para um “emergency room”, que é a sala de emergência de um hospital e é como chamamos em inglês.
Aqui cabe um parênteses, quando morava no Brasil meu plano de saúde era bem bom, cobria ótimos hospitais, inclusive Albert Einstein. Quando me mudei para Nova York e casei adquiri o plano de saúde do meu marido, que é há anos considerado o melhor plano de saúde dos EUA. Em outras palavras, assim como tenho o que tem de melhor no Brasil (meu pai paga meu plano de saúde do Brasil) eu tenho o melhor dos EUA. No entanto, pela minha experiência o atendimento Brasileiro é muito melhor.
Para quem não sabe, aqui em Nova Iorque não existe atendimento médico público e gratuito, apesar de que os hospitais são obrigados a te atender em caso de emergência, mesmo se não puder pagar. Depois de alguns dias do atendimento médico chega uma conta absurda na sua casa, só de dar entrada na emergência você paga mil dólares mais todos os procedimentos que usar. A maioria das pessoas não pagam essas contas altíssimas e ficam anos brigando com o hospital – eu mesma tenho uma conta de mais de 7 mil dólares por exames de sangue que um hospital conveniado do meu plano de saúde mandou para um laboratório não conveniado do meu plano fazer sem minha autorização. A conta já abaixou para 1600 dólares após seis meses, meu plano já pagou outra parte dessa briga, mas ainda não acho uma quantia justa já que o hospital falou que o laboratório me ligaria pedindo autorização, o que nunca aconteceu.
No meu caso, mesmo com plano de saúde pago uma porção do meu atendimento médico, eles chamam de “co-pay”. 100 dólares para emergência e 40 dólares por consulta com especialista e hora marcada, esse valor é geralmente cobrado na hora! No Brasil também pagava, mas o valor era muito menor e quando eu trabalhava, vinha no meu holerite. Ir ao médico nos EUA é tão caro que a minoria das pessoas fazem exames preventivos, esperando a doença se agravar e ser atendido num “emergency room”.
Então quando cheguei no hospital naquele dia após a descoberta da gravidez ectópica, fiquei esperando o pré atendimento. Demorou exatamente uma hora para eu fazer o check in no hospital. Tinham 4 pessoas antes de mim, sendo que uma desistiu de tanto esperar. Daí você vai lá e o enfermeiro pergunta o motivo da sua visita, tira a pressão e mede a temperatura. Depois dessa triagem você vai para outra fila, a fila para apresentar seus documentos, colocar seu endereço (para depois chegar sua conta em casa).
Senta e espera novamente chamar o seu nome. No caso desse hospital eles te chamavam via autofalante. Da minha entrada até eu ser chamada, levou cerca de duas horas. Isso todo mundo tem o mesmo atendimento até aí, só quem chega de ambulância corta a fila.
Quando chamam o seu nome você passa por uma porta, após essa porta tem várias salas cheias de pessoas como nos filmes de emergência médica. Ninguém vem para te recepcionar. No meu caso um bombeiro me viu perdida e me apontou aonde deveria fazer o check in.
Embora tivessem chamado o meu nome, ninguém me esperava. Quando entrei nessa emergency room fiquei chocada. Várias pessoas em camas separados por cortinas. Contei 14 camas entre cortinas. Mas tinham muitas pessoas fora das cortinas deitadas em camas em todos os lugares, como corredores e ao lado do banheiro ou balcão dos médicos – assumi que essas pessoas fora das cortinas não tinham plano de saúde, porque vi até uma moça algemada e acompanhada de policiais. Exatamente como vemos nos hospitais públicos do Brasil pela televisão. Falei para meu marido “nunca tive uma experiência dessas”. Nem mesmo quando levava minha avó em hospitais públicos de São Paulo vi pessoas doentes de tudo quanto é jeito deitadas para tudo quanto é lado.
Fui colocada no box de número 13. Fiquei de pé esperando, não estava doente, não tinha nenhuma dor ou sintoma! Mas logo tive que colocar a camisola hospitalar e deitar. Tenho certeza que se meu pai estivesse comigo ele pediria para ir para o box 14, o único disponível no momento. Meu pai e supersticioso o que me faz ser um pouco também.
As enfermeiras vieram supersimpáticas e tristes com a nossa dor. Para colocar a agulha do soro em mim foi uma desgraça, fura aqui, fura ali, chama outra pessoa e uma coisa que é praticamente indolor começa a incomodar, ficar roxo e arder.
Reclamei de ter que usar a camisola do hospital e tomar soro. As vezes tenho a impressão que os hospitais adoecem a gente desnecessariamente. Mas a mulher disse que o soro era necessário para fazer o ultrassom com mais clareza, então fiquei quieta. Queria saber o que estava acontecendo com meu bebê!
Fui me trocar num banheiro da enfermaria. Fedia mijo e estava sujo como banheiros de rodoviária do Brasil. Fiquei muito decepcionada, aquilo podia nos deixar mais doente.
Após uma hora mais ou menos o soro acabou e a enfermeira chegou imediatamente. Pouco antes o hospital havia enviado uma mensagem que os acompanhes deveriam deixar o hospital (acho que era o fim da hora de visita), comecei a chorar, mas deixaram meu marido ficar comigo. Eu tremia de medo e frio. Tremia muito!
Fui fazer o ultrassom, uma senhora me buscou com a cadeira de rodas. Eu estava bem, de novo, eu detesto quando os hospitais fazem isso, mas fui sentada até a sala de ultrassom porque fiquei com medo da minha bunda ficar para o lado de fora!
Chegando lá o técnico era um homem. Ele explicou que era o único técnico de ultrassom no momento no hospital e perguntou se aceitava fazer o exame transvaginal com ele. Falei que sim, então eu tive que assinar um documento de consentimento e ele chamou uma mulher para acompanhar o exame. Nesse momento separaram meu marido de mim.
Lamentavelmente não tinha nenhum bebê no meu útero. Mas ele também não estava nas trompas, que foi um alívio para mim naquele momento. Tenho uma trompa só, ter que retirar ela por exemplo, dificultaria minhas chances de ser mãe. No entanto, semanas mais tarde descobri que o bebê estava nas trompas, mas isso é assunto para outro post!
Logo após fui chama por uma ginecologista que me examinou por muito tempo, pediu para eu deixar ela repetir os exames de ultrassom. Fez exame de toque e constatou que não tinha sangramento.
Falou que ia ligar para a minha médica para dizer o que fazer e minutos depois chegou a triste notícia, me dariam uma injeção para tirar o bebê!
Fiquei muito decepcionada. Tentei recusar, chamei outro médico e eles disseram que o bebê poderia causar hemorragia em outros órgãos e isso poderia custar a minha vida. Também explicou que no momento o tratamento seria apenas essa injeção, se deixasse para depois o tratamento seria cirúrgico e podia ser pior porque não acharam o bebe em nenhum dos exames.
Aqui cabe espaço para dizer uma coisa ruim que aconteceu comigo nesse momento. Não havia contado da gravidez para ninguém, mas no momento que estava internada uma amiga começou me mandar mensagens me chamando para sair e falei que estava tendo uma gravidez ectópica. Gente, esse diagnóstico já é ruim por si só. E desde que fiquei grávida eu só lia sobre isso e sabia os riscos, tratamentos etc. Quando expliquei para ela que iam dar uma injeção para tirar o bebê, ela começou a mandar mensagem “de como eles tinham certeza que esse era o tratamento, porque ela estava lendo e muitas vezes era cirúrgico”.
Eu já tinha lido isso, aliás, já tinha estudado todos os tipos de cirurgia sobre o caso, porque esperei muito durante o atendimento. Quando falei com o primeiro enfermeiro ele já me acalmou e disse que pelo tempo da minha gravidez o tratamento seria uma injeção (duas no máximo), por isso o pré-natal cedo é importante. Até hoje não entendi o porquê dessa pessoa tentar fazer do meu momento difícil algo pior. Mas fica a dica para vocês, quando ver uma pessoa num quadro ruim, não tente deixá-la ainda pior, mesmo que você tenha lido na internet. Você provavelmente não tem nenhuma informação médica sobre o histórico de saúde da pessoa e mesmo se tiver, não seja indelicado.
Quando a enfermeira entrou com aquela agulha de líquido amarelo tive vontade de sair correndo. Aquilo era uma sentença de morte para meu filho! Meu primeiro filho! Ela me pediu para virar de lado, a injeção seria no bumbum. Conforme aquele líquido geladinho foi entrando no meu corpo fui sentindo uma dor muito grande, não dor física, mas uma dor na alma que acredito que só quem já sofreu uma gravidez ectópica sentiu.
Após pouco mais de seis horas no hospital recebi alta e pude ir para casa.
Estava com um sentimento muito estranho, tinha tido a felicidade que engravidar naturalmente, mas a tristeza de ter uma gravidez ectópica. É como ir do céu ao inferno!
E para finalizar com chave de ouro aquela amiga disse no final: “Ainda bem que você vê algo positivo em tudo isso” e eu vi, não por perder o bebê, mas por engravidar por meios normais apesar dos meus problemas e principalmente porque naquele momento acreditava não ter tido gravidez nas trompas, não ter sofrido hemorragia e não ter perdido nenhum órgão ou feito cirurgia. Dos males o menor. Acredito que enxergar os momentos ruins de uma forma mais positiva e agradecer não ter sido pior faz a gente digerir melhor as dificuldades da vida e evoluir. Hoje tenho meditado muito, lido muito sobre os conceitos de apego e de iluminação. Talvez isso tenha me ajudado bastante nessa perda tão traumática e dolorosa!
2 thoughts on “Minha experiência no Emergency Room em Nova York ”
Yasmin
Debora, deixo aqui a minha solidariedade e o meu carinho nesse momento tão difícil que ainda foi mais complicado por toda essa confusão e procedimentos no Hospital, desejando que você esteja bem e refeita, agora, mando um beijo e um abraço apertado de Sampa!
Debora Wolf
Obrigada meu amor, isso já tem um ano. E escrevi tudo em forma de diário…